No fim, só fica o nome
sem pedir licença,
como se a areia já fosse sua,
como se o meu corpo já fosse sua casa.
E eu, que sempre fui feito de muros e fechaduras,
de distâncias medidas com precisão,
de promessas guardadas a sete chaves,
deixei você entrar.
Abri portas que nem eu sabia que existiam,
te entreguei as chaves dos meus medos,
deixei que bagunçasse cada canto
do que eu chamava de mim mesmo.
E como foi bom!
O tempo parava quando você me olhava assim,
como se eu fosse o único milagre que já viu.
O mundo todo cabia no espaço entre nossos dedos,
nas linhas do seu sorriso,
na febre mansa da sua pele.
Era fácil te amar.
Fácil como respirar, como rir de olhos fechados,
como esquecer o tempo numa conversa sem fim.
Eu sabia de cor seus sinais,
seu jeito de me encarar antes de me beijar,
as palavras que você nunca dizia,
mas que eu lia nos seus olhos.
Você era casa.
Refúgio.
Certeza.
Mas o amor tem suas manhas,
suas sombras,
suas pegadinhas de menino travesso.
E foi assim que veio a primeira dúvida,
tão pequena que quase passou despercebida.
Uma palavra que soou errada,
um olhar que não se demorou como antes,
um beijo que durou um segundo a menos.
De repente, não sabíamos mais como segurar as mãos.
O silêncio, antes tão confortável,
virou um abismo impossível de atravessar.
Seu riso já não me encontrava,
sua voz soava distante,
como um som vindo de um lugar onde eu já não estava.
Me diz, onde foi que nos perdemos?
Foi no tempo que passou rápido demais?
Ou na rotina que se impôs sem que percebêssemos?
Foi no excesso de certezas,
ou na falta delas?
Você foi se afastando devagar,
tão devagar que, quando percebi,
já não havia mais pontes entre nós.
E eu, que um dia soube cada detalhe seu,
já não sabia mais como seguir seus passos.
E então veio o adeus.
Não aquele gritado entre lágrimas e portas batidas,
mas o adeus mais cruel de todos:
aquele dito em silêncio,
na desistência lenta,
na ausência vestida de presença.
Você se foi,
mas deixou um rastro.
Um cheiro que ainda dorme nos meus lençóis,
um gosto que ainda arde na minha boca,
um vazio que carrega seu nome.
E o que eu faço agora?
O que eu faço com essa saudade que não se cansa?
Com esse amor que não entende que acabou?
Me diz,
como desapego de nós?
Como desfaço esse nó,
esse fio que ainda me puxa na sua direção?
Posso me enganar com outros amores,
posso fingir que o tempo leva tudo,
posso até sorrir para o mundo como se não doesse.
Mas sei que, à noite, quando a cidade se aquieta
e a solidão se espalha pelo quarto,
vou fechar os olhos e, por um instante,
vou jurar que ainda ouço sua voz.
E, no fim,
quando tudo já tiver ido embora,
quando todas as lembranças forem só poeira na estante,
quando já não restar mais nada de nós,
sei que ainda haverá algo,
pequeno e teimoso, que nunca se apaga.
No fim,
só fica o seu nome.
— Antônio Reis