Escuta
Mas escuta sem pressa.
Eu não quero que saibas.
Não quero que vejas o que me rasga por dentro.
Mas a dor tem seu próprio jeito de gritar,
de riscar os olhos, de marcar os pulsos,
de se fazer escândalo mesmo quando sussurrada.
Eu me calo, mas meu silêncio te chama.
Eu finjo que esqueço, mas meu corpo ainda te sabe.
E cada passo que dou é um círculo,
um regresso disfarçado de partida.
Existe saudade?
Ou é só essa mania da alma de se debruçar no que já foi?
Porque eu já nem sei.
Nem sei há quanto tempo não sou inteiro,
há quanto tempo me parto em metades que não encaixam.
E se o tempo não para, por que eu ainda estou aqui,
estancado no mesmo lugar onde você me deixou?
Eu corro, eu volto, eu me jogo.
Eu me enrolo nas tuas memórias feito lençol quente,
feito promessa repetida,
feito música que toca e toca e toca,
até virar silêncio.
Escuta.
Eu estou cansado.
Cansado dos mesmos caminhos,
dos mesmos passos,
dos mesmos erros que já conheço de cor.
Desta vez, se fores,
não me deixes saudades.
Não me deixes metade.
Ou fica inteiro,
ou leva tudo.
Mas não me deixa esse vazio que tem o teu nome.
— Antônio Reis